sábado, 28 de junho de 2008

NOSSA SOCIEDADE NÃO ENVELHECE


Um amigo me emprestou um texto para ler que fala sobre a velhice. Houve um comentário da autora a despeito da diferença entre ficar velho e a perda de memória decorrente da velhice; tenho 27 anos e fiquei chocado ao perceber que um atual discurso repetido constantemente sobre mim e meus pais quando esquecemos alguma coisa é: "Não se preocupe é a idade", contudo o texto tem como pedra fundante essa crítica: envelhecer é condição sine qua non de perda de memória? Ou há uma pressão social para criar um "discurso do velho".
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Quem envelhece fica automaticamente doente ou dizemos isso para ter uma desculpa ao afastar os velhos da nossa sociedade.
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Meu pai conserta ventiladores e está aprendendo a dançar. Minha mãe dança, faz hidroginástica e lê sem parar. Eles estão velhos? O que é ser velho hoje? Consumir, navegar na internet? Eles não compram com a mesma voracidade que nós e por isso são velhos? Eles não se interessam por orkut e messeger e por isso devo colocá-los em um asilo?
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Hoje consome-se produtos para não envelhecer. Mulheres com 40 e 50 anos montadas a botox e cirurgias plásticas viram símbolos sexuais novamente e dizem estarem ativas na cama como nunca! Nossa sociedade não quer ficar velha. Estamos vivendo em uma fonte da juventude. Ninguém envelhece, ninguém tem o direito de envelhecer.
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Tudo isso reflete o medo que as pessoas tem de ser esquecidas, que todos a considerem velha e por isso a enterrem viva em um asilo, ou na casa dos próprios filhos. Nós fazemos dos velhos doentes e incapacitados. Falamos sobre velhice como um estado terminal, como o fim. Envelhecer é saber, mas ficamos surdos para os velhos. Eles estão doentes demais para falar e velhos demais para se esforçar em ensinar. É melhor que fiquem, como no imaginário popular, nas suas casas comendo biscoito com leite e se balançando em uma cadeira de balança esperando o dia de sua morte que não tardará em vir.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

NUNCA TOCAMOS O REAL


Outro dia eu estava (re)lendo o livro de Kock, Coerência Textual, e me deparei com uma frase muito curiosa da autora: "O mundo criado pelo texto não é, portanto, uma cópia fiel do mundo real, mas o mundo tal com é visto pelo produtor a partir de determinada perspectiva, de acordo com determinadas intenções." (KOCH, 1999, p. 70)

Se o texto é uma tentativa de representar o mundo real, mas como fica claro nas palavras da autora, não é possível dizer que ali está um real limpo e imaculado, logo o real passa a ser algo que nunca poderemos vislumbrar. Lembro também de minha professora do curso de pós-graduação em Lingüística Aplicada as Práticas Discursivas, Tany Monfreddini, para a qual a realidade era "olhar através de um par de óculos", cada autor possui seu próprio "par de óculos" e ao lê-los nós devemos tentar entender que "par de óculos" ele usou. Esta metáfora é necessária para não fazermos leituras equivocadas do pensamento de Koch.

Nosso "par de óculos" é a maneira como enxergamos o mundo. Ler, portanto, é apreender um recorte da realidade e que possivelmente, levará o nosso próprio corte quando começamos a divagar sobre aquilo que acabamos de ler. Isto, talvez, nos leve a compreender por que os livros de auto-ajuda são em si mesmos gotas d'águas no oceano. Crer que um livro possui a resposta para um problema é imaginar que o autor é Deus: Omnipotente, Omnisciente e Omnipresente. Mas, os livros de auto-ajuda são recortes da realidade, um ponto de vista de alguém que passou por uma experiência (quando passou claro!!!) e resolveu contar em um livro o que fez, mas não é assim que as pessoas consomem essa literatura e muito menos como ela é vendida.


Os livros de auto-ajuda são vendidos como manuais do bem viver; ser feliz é uma questão de ler e perceber ali a resposta para os seus problemas, mas fica a pergunta: somos iguais? sentimos as coisas do mesmo jeito? passamos por experiências idênticas? com as mesmas pessoas? O outro mostrou seu "par de óculos", eu preciso aprender a montar o meu, através da minha própria leitura do mundo, não dando a "autores mais vendidos" o direito de dizer como devo ver essa realidade nunca quista.


Uma metáfora é possível para concluir essa leitura, Hércules em seus doze trabalhos tinha que enfrentar a Medusa; aquele monstro mitológico que tinha os cabelos de serpente e transformava em pedra todos aqueles que a olhassem diretamente nos olhos. Os livros de auto-ajuda são como Medusas que transformam em pedra seus leitores ao paralisá-los, iludido-os com a fórmula da felicidade, mas devemos olhar a vida assim como o fez Hércules, através do reflexo, daquilo que a imagem nos parece ser e talvez nunca seja. Ler é ver um reflexo do real, mas nunca o real.