quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

SE DEUS QUISER - O DISCURSO DA ACOMODAÇÃO

O fim de ano é marcado pelas promessas. Juramos melhorar aquilo que não melhoramos em 2008, mas que após a virada esqueceremos ou percebemos que desejar e fazer são dois verbos com sentidos bem distintos.

No entanto, os pedidos são geralmente acompanhados de um enunciado bastante reincidente no discurso do brasileiro: “Se Deus quiser...”; gostaria de convocá-los a uma reflexão desta frase aparentemente tão inocente, pois, e é isso que desejo evidenciar, ela esconde um discurso da acomodação nossa diante de nossa própria vida. Vejamos como isso acontece.

Quando dizemos “Se Deus quiser...”, estamos nos livrando a obrigação de fazer com que aquilo que desejamos se realize. O raciocínio é lógico. “Se Deus quiser...” representa que a realização independe de mim. Deus realizará o feito, não eu, por isso, se o feito não foi concretizado isso vai implicar dizer que Deus não considerou o momento exato, não foi culpa minha. A conjunção “se” no início da frase a testa gramaticalmente o que foi dito. Essa conjunção é condicional, ou seja, indica uma hipótese. Um fato que pode ou não acontecer e como já acha-se no plano hipotético, não ocorrendo, está-se dentro do esperando.

O verbo “querer” também precisa ser analisado. Ele vem do latim quaerere que significa “procurar”, “buscar”. Na frase em questão, apenas fica mais demarcado o livrar-se das responsabilidades, já que esse “querer” ou seja, essa “busca” é para Deus, não para nós mesmos. Lançar essa responsabilidade para outro é costume comum e corriqueiro nas terras tupiniquins. Evita conviver com o fracasso, com a perda. O erro advém doutras pessoas, o sucesso é nosso.

Segundo Melanie Klein, uma psicanalista freudiana que se dedicou ao estudo da infância, momento não aprofundado por Freud, existe uma fase em que vemos nossa mãe de maneira fragmentada. A criança concebe que há uma mãe boa, que lhe alimenta, dá carinho e afeto; uma mãe má, que lhe nega tudo o que a outra oferece. Essa visão distorcida da mãe só será vencida quando a criança perceber na mãe o mesmo ser, o bom e o mau. Enxergar o mundo dividido em bom e mau é vê-lo incompleto. Da mesma forma que jogar as nossas responsabilidades para Deus, quando realizados nossos desejos vemos um Deus bom, e quando não o são vemos um Deus punitivo, é nos ausentar de responsabilidade.

Ao ver o mundo de maneira fragmentada estamos nos ausentando da responsabilidade por nossos fracassos. É como se disséssemos que “deu errado por que o lado ruim de Deus assim desejasse”. Devemos aprender que somos extremamente responsáveis por nossas escolhas, que temos um caminho a percorrer, que pode ser árduo, mas se é esse o preço a pagar para obter aquilo que desejamos assim será.

Por isso, creio que a resposta para a frase “se Deus quiser” esteja em um filosofo francês chamado Jean Paul Sartre. Sartre possui uma celebre frase em que diz: “O ser humano é condenado a ser livre”. Mas antes de expor-lhes a solução deste filosofo vamos compreender sua frase. Para ele, o ser humano moderno tem bastante liberdade, seja para escolher sua profissão, para escolher a pessoa com quem vai casar, para escolher que escola colocará seus filhos..., essa liberdade nos torna responsáveis pelo que fazemos de nossas vidas e como nossas escolhas são sentidas pelos outros. Logo, diz Sartre, devemos viver pensando que impacto aquilo que fazemos terá sobre a vida das outras pessoas a nossa volta.

Se levarmos esse pensamento a sério, não só estaremos dando uma resposta para aqueles que vivem presos a no dizer “se Deus quiser”, mas também, usufruindo da responsabilidade para com os outros, viver sendo responsável por si e pelos a sua volta. São pensamentos assim que poderiam evitar comportamentos tão destrutivos como o consumo em demasia que é responsável pela poluição e no mesmo sentido pelo aquecimento global.

Obrigado, por sua atenção e dedicação a esta leitura. Qualquer crítica ou sugestão pode manda-me um e-mail, ou postar aqui no blogger.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Orações subordinadas substantivas subjetivas

Existe um mito de que professor sabe de tudo, essa idéia nasce de um princípio simples, sendo o principal transmissor de saberes, depois da família, o professor deve conhecer exatamente aquilo que diz em sala de aula. Para nossa sorte, isso é uma falácia.

Lembremos que para a filosofia saber é ignorância. Confuso? Explico-me. Quando alguém se julga detentor de todo o saber não aceita novas concepções, idéias novas, afinal ele sabe de TUDO. Como pode mudar, evoluir, melhorar? Para mudar é preciso admitir que o que antes falava não vigora mais ou existem novas maneiras de resolver o problema.

Sócrates, filósofo grego, considerado o pai da filosofia disse: “Só sei, que nada sei”. Como um filósofo, uma pessoa que vive para pensar pode dizer que a única coisa que sabe é que ele não sabe de nada? Porque para saber algo novo a primeira coisa que é necessário fazer é simplesmente admitir que não sabe sobre aquilo. Para aprender a dançar, preciso admitir que não o sei. Se soubesse, não estaria tentando aprender, certo? Nós professores aprendemos sempre e, por isso, não somos os detentores de todo o conhecimento sobre nossa disciplina.

Todo esse falar introdutório serve de ensejo para dizer como aprendi a analisar as orações subordinadas substantivas subjetivas. Nunca tive a chance de lecionar orações subordinadas em uma turma. Ano passado fui convidado a ensinar num 8º ano (antiga 7ª séria), de modo que quando me vi em sala iniciando o assunto parecia saber perfeitamente do que falava até chegar aos exercícios. Na época do cursinho, meu professor de português ensinou que para identificarmos as orações subordinadas substantivas apenas precisaríamos notar naquelas orações que se iniciassem com o verbo “ser”.

Bem, foi isto que eu disse aos meus alunos, mas quando chegou nos exercícios... Não havia dúvida a resposta estava lá, era uma oração subordinada substantiva subjetiva, mas cadê o verbo “ser”? Nenhum sinal dele. Nessas horas nada melhor a fazer do que usar a própria experiência para encontrar a resposta e foi no meio de muito reflexão, enquanto os alunos respondiam o exercício, que percebi uma lógica simples, mas extremamente eficaz. Vamos direto para o exemplo. Na frase: “Diz-se que Homero era cego”, há uma oração subordinada substantiva subjetiva, como saber? Simples, percebe-se de cara a ausência do verbo “ser” no início da frase; todos sabemos que um período composto é formado por mais de um verbo que na frase em questão seriam, respectivamente “diz” e “era”. Sabemos, também, que a conjunção “que” marca o início da oração subordinada, portanto a oração principal é “Diz-se” e a oração subordinada é “que Homero era cego”, mas como classificar está última, então?

Recorramos ao conceito. A oração subordinada substantiva subjetiva é aquela que exerce a função de sujeito da oração principal. Ora, pensemos, se a oração subordinada é o sujeito da oração principal, significa dizer que não haverá sujeito na oração principal, será verdade? Analisemos a frase em questão. “Diz-se que Homero era cego”. Na oração principal, “Diz-se”, quem é o sujeito? Difícil de encontrar? Façamos a pergunta: que é que diz-se? Resposta: Que Homero era cego. Tente fazer o mesmo em outras frases e perceberam que na maior parte dos casos esse fato decorre.

Espero ter contribuído com o enriquecimento de vocês, qualquer dúvida postem no blogger ou envie-me um e-mail.

Obrigado por sua atenção!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Muito além de um crime


Ninguém esquecerá 2008. Não por ter sido o ano do Pan ou qualquer glorificação esportiva. Não! 2008 será o ano em que vimos uma série de crimes cometidos entre familiares, sejam pais que matam filhos, filhos que matam pais, maridos que matam esposas..., gostaria que nos detivéssemos do primeiro caso: quando pais matam filhos, para usarmos como ensejo o recente episódio em que o padrasto matou a filha com o consentimento da mãe. Mais uma morte? Mais um crime hediondo? Mais um corpo para as estatísticas? Acho que não.

Existe, neste caso, algo singular com outros como o de Isabela Nardoni e o de Eloá: a presença da mídia. De uma hora para outra, pessoas simples são transformadas em popstars do crime. E, por incrível que pareça, as pessoas parecem mais motivadas a este tipos de atitudes. "O que levaria um padrasto a fazer isso a uma criança?", é a pergunta que muitos jornalistas se fazem, mas façamos outra: "o que leva um padrasto e uma mãe a convocarem a impressa televisiva para, em uma performance dramática, digna de um Oscar, diga-se de passagem, clamarem para 'quem souber do paradeiro, entrar em contato'"? Em uma sociedade que tornou sucesso sinônimo de felicidade, não seria crível ver pessoas que fariam de tudo para aparecer na tevê, ser capa de revista ou ter a foto estampada na manchete de um jornal. Talvez até matar? Tanto no caso em questão como no caso Eloá vemos essa visão cinematográfica do crime surgindo de modo inquisidor. Pessoas simples a procura dos seus quinze minutos do fama. Chegar em certa idade e perceber que o tal "sucesso" não aconteceu pode levar algumas pessoas a atos que muitos de nós julgaríamos como impossíveis para um ser humano. Talvez isso explique a frieza dos assassinos em relatar como fizeram o que fizeram, a ausência de sentimentos dá vazão ao dever cumprido: "Mamãe, eu tô na Globo!".

Num país que estrelas nascem de um dia para o outro, forçando-nos ao mal-estar do "não sou tão famoso quanto fulano" ou "fulano é feliz, porque é famoso" é admissível que se mate para alcançar o estrelato. Na psicanálise freudiana, o esquizofrênico sofre de mania de grandeza, ou seja, imagina que pessoas famosas ou poderosas queiram matá-lo. Hoje algo semelhante ocorre, lutamos contra as "estralas cadentes", que ameaçam nossas vidas com seu sucesso repentino e sua aparente felicidade, a ponto de levar pessoas humildes e honestas a matar para não só destruir simbolicamente esses "deuses midiáticos", mas também para superá-los e tornarem-se tão grandes quanto eles.

Geralmente, falando a meus alunos de pré-vestibular, tento mostrar a diferença entre se sentir uma pessoa realizada e ter sucesso. Para isso, costumo dizer-lhes o seguinte: "Estou aqui dando aula para vocês, estou cansado, porque dormi mal preocupado com o conteúdo de hoje, passei a noite revisando mentalmente minha aula. Tenho que estudar, pois estou preparando um artigo sobre déficit de aprendizagem para apresentar em um congresso e não sei se conseguirei terminar, não tenho muito tempo para ler. Minha família pede minha atenção e estou sempre ocupado; minha namorada pede minha atenção e também estou ocupado. Não tenho tempo para lazer, o pouco tempo que disponho gosto de estudar para ministrar aulas melhores. E sabe por que eu escolhi ser professor? Porque '"estou aqui dando aula para vocês, estou cansado, porque dormi mal preocupado...'". Ser feliz ou ter sucesso vai muito além de aparecer na televisão, mas sim quando você mede prós e contras de suas escolhas e percebe que pode conviver com elas.