domingo, 28 de março de 2010

A ARMADILHA DA CORRUPÇÃO [3.11.2005]


No fim de semana passado, estive no encontro do Instituto DNA Brasil, em Campos do Jordão. O evento reunia pessoas representativas de várias áreas, para que, durante três dias, debatessem sobre os meios para tornar o país "justo e habitável com dignidade".

Um dia inteiro foi dedicado ao tema da corrupção. A imprensa já relatou as sugestões às quais a gente chegou, consensualmente ou quase: desde o financiamento público das campanhas até o voto distrital misto ou a possibilidade de revogar os mandatos antes do seu fim.

No sábado, bem na hora em que começava a discussão sobre a corrupção, chegou a revista Veja, com a reportagem de capa sobre o suposto financiamento cubano na campanha do PT de 2002.

A pior conseqüência desta série interminável de denúncias e apurações é a aparente "confirmação" de um lugar-comum desastroso: "Eles são todos corruptos" ("eles" são, no caso, os políticos).

Não me importa agora decidir se "eles" são mesmo todos corruptos. Tampouco penso que a imprensa tenha de esconder o que ela descobre só para não "comprovar" que "eles são todos corruptos". Mas o fato é que esse lugar-comum é uma armadilha para nossa capacidade de agir como cidadãos.

Aparte: a reunião do DNA não caiu na armadilha da indignação diante da corrupção generalizada, e esse não foi o menor de seus méritos. Mas a exceção não derruba a regra que vou expor.

Qual é o efeito em nós do "eles são todos corruptos"?

Várias vezes, nos últimos meses, fui entrevistado sobre o estado de espírito dos brasileiros nas circunstâncias atuais. A pergunta, quase sempre, sugeria a resposta esperada: "Quais são os efeitos em seus pacientes da decepção e da depressão nacionais?". Em geral, respondi, preguiçosamente, que, de fato, os acontecimentos são tristes e deprimentes.

Mas essa resposta óbvia (para a qual não seria preciso um especialista) é falsa.

Em regra, o narcisismo da gente funciona assim: quanto maior a imperfeição do mundo, quanto maior a decepção que nos é imposta pela conduta dos outros, tanto maior é nossa exaltação narcisista. No caso, atrás das queixas, a constatação de que nossos representantes e governantes seriam todos corruptos está longe de ser depressiva.

É lógico: acreditar que os outros sejam todos deficientes morais é o melhor jeito de afirmar que nós, ao contrário e em comparação, somos gigantes da moralidade.

Contemplar o mundo como um vasto teatro de defeitos equivale a erigir um monumento à nossa suposta integridade, graças ao seguinte raciocínio implícito (capenga, mas gratificante): se podemos constatar que todos os outros são corruptos, é porque somos os ÚNICOS limpos. De repente, confirmar nossa grandiosa unicidade se torna nossa ocupação principal. Com isso, é paralisada nossa capacidade de transformar o mundo.

A psicologia do self (esta foi, ao meu ver, sua maior contribuição à psicanálise) mostrou o seguinte: temos acesso ao mundo e a uma ação minimamente eficaz para transformá-lo quando paramos de contemplar sua imperfeição (celebrando a unicidade de nossa diferença) e enxergamos na realidade algo (diferente de nós) que possamos idealizar.

Por exemplo, se vivo numa cidade em que acho horríveis todas as habitações salvo a minha, dedico-me integralmente a caiar de branco a fachada de minha casa, na qual, aliás, fecho-me como num sepulcro. Mas se reconheço que, na cidade, há outras moradias que são mais bonitas do que a minha, há chances que um dia eu queira sair de pincel e vassoura na mão para pintar de branco as fachadas da cidade inteira e para lavar as calçadas.

O que vale para as casas vale para os outros. Se acho que todos os outros são imperfeitos, considero-me como a única exceção, torno-me meu próprio ideal, ou seja, só idealizo (e amo) a mim mesmo. É a razão pela qual, em geral, um terapeuta se abstém de julgar moralmente seus pacientes: quem julga está quase sempre mais preocupado em comemorar sua própria integridade do que em entender o outro.

Em suma, as denúncias que assolam nosso cotidiano podem dar lugar a uma vontade de transformar o mundo só se nossa indignação não afetar o mundo inteiro. "Eles são TODOS corruptos" é um pensamento que serve apenas para "confirmar" a "integridade" de quem se indigna.

O lugar-comum sobre a corrupção generalizada não é uma armadilha para os corruptos: eles continuam iguais e livres, enquanto, fechados em casa, festejamos nossa esplendorosa retidão.

O dito lugar-comum é uma armadilha que amarra e imobiliza os mesmos que denunciam a imperfeição do mundo inteiro.

Nota: alguns conseguem contemplar e lamentar a imperfeição do mundo sem se gabar de sua própria perfeição. O melhor exemplo (e o mais raro) são os santos. A santidade não consiste só em reconhecer suas próprias falhas ou em perdoar as falhas dos outros. O santo, além disso, enxerga a imperfeição do mundo, mas continua encontrando razões para amá-lo, ou seja, continua encontrando seus ideais lá fora, na banalidade imperfeita dos outros.


Autor: Contardo Calligaris

sábado, 27 de março de 2010

REFLEXÕES SOBRE O GOVERNO LULA


"Pode ser até que chegue ao poder (uma liderança revolucionária que não seja dialógica com as massas), mas temos nossas dúvidas em torno da revolução mesma que resulta deste quefazer antidialógico." (Pg.144)


"Se são levas ao processo como seres ambíguos, metade elas mesmas, metado o opressor 'hospedado' nelas, e se chegam ao poder vivendo esta ambigüidade que a situação de opressão lhes impõe, terão, a nosso ver, simples impressão de que chegaram ao poder." (Pg.144)

"A verdadeira revolução, cedo ou tarde, tem de inaugurar o diálogo corajoso com as massas. Sua legitimidade está no diálogo com elas, não no engodo na mentira. Não pode temer as massas, a sua expressividade, a sua participação efetiva no poder. Não pode negá-las. Não pode deixar de pretar-lhes conta. De falar de seus acertos, de seus erros, de seus equívocos, de suas dificuldades." (Pg. 145)"Daí que o populismo se constitua, como estilo de ação política, exatamente quando se instala o processo de emersão das massas em que elas passam a reinvidicar sua participação, mesmo que ingenuamente." (Pg. 170)


"O lider populista, que emerge neste processo, é também um ser ambíguo. Precisamente porque fica entre as massas e as oligarquias dominantes, ele é como se fosse um ser anfíbio. Vive na 'terra' e na 'água'. Seu estar entre oligarquias dominadoras e massas lhe deixa marcas das duas."
Enquanto populista, porém, na medida em que simplesmente manipula em lugar de lutar pela verdadeira oraganização popular, este tipo de líder em pouco ou quase nada serve a revolução." (Pg. 170)
"É interessante observar a dramaticidade com que Vargas falou às massas obreiras, num primeiro de maio de sua última etapade governo, conclamando-as a unir-se." (Pg. 171)

Dicurso de Lula:

Aprofundamos nossos programas sociais, especialmente os de transferência de renda. Aumentamos os salários acima da inflação. Estimulamos, por meio de medidas fiscais, o consumo para impedir que se detivesse a roda da economia. (…)

Mas não tenho a ilusão de que poderemos resolver nossos problemas sozinhos, apenas no espaço nacional. A economia mundial é interdependente. Estamos todos obrigados a atuar além de nossas fronteiras. Por isso, é imprescindível refundar a ordem econômica mundial."

Discurso de Vargas:

"Quero dizer-vos, todavia, que a obra gigantesca de renovação, que meu governo está começando a empreender, não poder ser levada a bom termo sem o apoio dos trabalhadores e sua cooperação cotidiana e decidida."

"Enquanto a ação do líder se mantém no domínio das forças paternalistas e sua extensão assistencialista, pode haver divergências acidentais entre ele e grupos oligárquicos feridos em seus interesses, dificilmente, porém, diferenças profundas." (Pg.172)



"É que estas formas assistencialistas, como instrumento da manipulação, servem à conquista. Funcionam como anestésico. Distraem as massas populares quanto à solução concreta destas problemas. Fracionam as massas populares em grupos de induvíduos com a esperança de receber mais." (Pg. 172)

As citações paginadas foram extraídas do livro de Paulo Freire: Pedagogia do Oprimido. Esse livro foi escrito na década de 70.

Qualquer semelhança com as imagens é apenas mera coincidência!

sábado, 20 de março de 2010

A-HA (EU FUI!!!)

Não preciso falar que o show de A-ha, foi muito bom! Fui du*%$#! Minha noiva gravou os momentos finais do show, por isso deixo o vídeo para que não foi babar:


terça-feira, 16 de março de 2010

UM JEITO MUITO MACHO DE DOBRAR SUAS CAMISAS

Como um homem moderno já aprendi a passar minhas camisas, mas dobrá-las realmente é algo trabalhoso. Para isso que os homens na sua completa falta do que fazer inventaram isto (veja o vídeo):




Muito bom!

sábado, 13 de março de 2010

Casal deixa filha morrer de fome para criar filha virtual


Um casal sul-coreano “viciado em internet” deixou sua bebê de três meses morrer de inanição enquanto criava uma filha virtual na web.

O casal alimentava sua bebê prematura apenas uma vez por dia, segundo a agência de notícias oficial Yonhap. O oficial da polícia Chung Jin-won disse à Yonhap que o casal “perdeu a vontade de viver uma vida normal” depois que os dois perderam seus empregos.
Cinco meses depois de terem reportado a morte da bebê, o pai, de 41 anos de idade, e sua mulher, 25 anos, foram presos na cidade de Suweon, ao sul de Seul, no início da semana. Eles estavam foragidos desde a morte da criança.

A autópsia mostrou que sua morte foi provocada por um longo período de desnutrição. O casal teria ficado obcecado em criar uma menina virtual chamada Anima, no popular jogo Prius Online. O jogo permite aos jogadores interagir com Amina, ajudando a recuperar sua memória perdida e desenvolver emoções.

Já houve outros casos de morte ligados ao vício em jogos de computadores na Coréia do Sul, onde um jovem morreu supostamente depois de passar cinco dias jogando com apenas pequenos intervalos.

Fonte: http://jovemnerd.ig.com.br/jovem-nerd-news/internet/casal-deixa-filha-morrer-de-fome-para-criar-filha-virtual/

quinta-feira, 11 de março de 2010

INTERTEXTUALIDADE

Esse é um cometário feito a partir do concurso público de Escada (2009), da prova de língua portuguesa.

Percebe-se que os cursos estão se diversificando, além de questões sobre conteúdo gramatical, hoje encontramos uma grande variedade de questões que versão sobre conteúdos lingüísticos, explorando assim, outros aspectos do estudo da linguagem. Portan
to, os candidatos não devem preocupar-se apenas em memorizar normas gramaticais, mas compreender que há elementos também observáveis que não serão encontrados na gramáticas.

Vamos reproduzir a questão número 13 da prova referida:


É possível reconhecer uma relação de intertextualidade no seguinte trecho do Texto 2:


A) “No Brasil, menos do que em outros países.”


B) “Há episódios históricos interessantes em relação aos palavrões.”

C) “O jornal vinha cheio de asteriscos.”

D) “Como sempre, a certeza aumenta quando uma regra é
violada.”

E) “Mas nem só de palavrão vive o tabu.”


O texto 2 escrito por Sírio Possenti, um renomado lingüista brasileiro, discutia os palavrões e seu caráter contraditória, já que apesar de serem controlados pela comunidade lingüística, também concerne a quem profere um certo status social. No entanto, a questão pergunta sobre quais as frases mantêm uma relação intertextual. E aponta a resposta correta como a letra E. Vamos primeiro nos perguntar: "O que é intertextualidade?"

Ler um texto é sempre ler vários textos ao mesmo tempo. Nenhuma leitura seria possível se não trabalhássemos com o princípio da intertextualidade, as palavras, frases, enunciados, períodos textos, já foram usadas, alguém já as pronunciara antes legitimando assim seu uso. Precisamos de uma base para gerar nossos próprios textos. Ingedore Villaça Koch e Luiz Carlos Travaglia, em seu conhecido livro "A coerência textual", conceituam assim intertextualidade: "ocorre quando o produtor de um texo repete expressões, enunciados ou trechos de outros textos, ou então o estilo de determinado autor ou determinados tipos de discursos." (p. 75). Qual das frases da questão lembraria outra frase?

A letra E, quando o autor do texto diz: "Mas nem só de palavrão vive o tabu.", lembra-nos outro ditado popular, "Mas nem só de pão vive o homem".


Uma banda de rock nacional, chamada Pitty lançou um CD intitulado: "Admirável Chip Novo"; era uma intertextualidade, o título original pertencia a um livro de um autor chamado Aldous Huxley, "Admirável Mundo Novo". No ano de 2004, uma das redações da FUVEST trazia no título: "Admirável Mundo Digital".
Percebe-se que a intertextualidade está presente no dia-a-dia, mas escapa ao conteúdo gramatical. Sem intertextualidade seria impossível, por exemplo, falar. A nossa fala está invadida por vários outros falares. Sabemos como saudar uma pessoa que encontramos na rua, ou perguntar as horas a um estranho, porque vimos e ouvimos alguém fazê-lo antes de nós e somos capazes que reproduzir o que foi apreendido.

É isso! Um forte abraço!

Para fazer o download da prova do Concurso de Escada - 2009 basta clicar no link abaixo:


PROBLEMAS DA EDUCAÇÃO HOJE!


Um peso e várias medidas


No filme, “Ao mestre com carinho”, vemos um professor negro que na verdade é formado como engenheiro e para não ficar desempregado, assume o papel de educador. Mesmo recebendo um salário baixo, ele persiste na profissão causa uma revolução numa sala de aula de adolescentes desordeiros. Os elementos que figuram esse filme estão presentes em diversas obras cinematográficas que desejam retratar a sala de aula. A figura do professor(a) pobre que revoluciona a sala de aula é épica e lendária, e é usada como discurso para nunca (ou quase nunca) debatermos sobre uma remuneração digna para os docentes.


Em um mundo capitalista, onde a mais-valia é imperativo fundamental, os empregos que melhor remuneram seus empregados são aqueles que pela lógica própria do capital atraem as melhores cabeças. Dessa forma, os cursos de licenciatura tornam-se sub-opções nas escolhas dos candidatos que prestam vestibular. Para confirmar esse raciocínio basta dizer que nenhum estudante conclui o ensino médio, faz a prova do vestibular e passa de quatro a cinco anos em média na faculdade para tornar-se (com todo o respeito e necessidade dessas profissões) motoristas de ônibus, copeiras, lavadeiras, empregadas domésticas, domésticas, catadores de lixo, camelôs...; hoje, um cobrador de ônibus recebe um salário maior que um professor que possui uma carga-horária alta como, por exemplo, o limite que é duzentas horas-aula.


O ingresso nos cursos de licenciatura faz-se por não-capacidade de ingressar em outros cursos. O aluno de Letras muitas vezes queria fazer jornalismo ou direito, ou ciências sociais, mas por incapacidade de atingir a nota para estes, acaba optando por aquele; o estudante de biologia outrora vislumbrava o curso de medicina, enfermagem, ciências biológicas, contudo, por motivos idênticos, cursa a licenciatura em ciências biológicas, resultado não será um bom profissional. - Não estamos, em momento algum, negando o fato de que haja pessoas nos curso de licenciatura que o façam por vocação, muito menos que essas “coincidências” não venham a resultar num acaso vindouro, já que o estudante pode no fundo perceber que apesar do desejo frustrado de fazer medicina, sua vocação é realmente ser professor de biologia. - Ressalta-se, por outro lado, o caráter lógico-dedutivo, de que cursos de licenciatura que oferecem oportunidades de empregos com boa remuneração resultariam em classes de cursos superiores repletas de pessoas de suma excelência e não, como ocorre hoje, nesses cursos onde índices de desistência são altíssimos ou os discentes saem das faculdades e procuram outros empregos que lhes proporcionem uma remuneração melhor.


Não se deve culpar quem faz isto de covardia ou abandono profissional. Como dissemos mais acima, não devemos nunca perder o foco de que falamos de um pais que vive no e a partir do sistema capitalista. E, lugar-comum a parte, “amor não enche a barriga de ninguém”. O amor aqui deve ser entendido como amor a profissão, que muitos possuem, mas poucos conseguem conciliá-lo com a situação financeira. Daí, voltamos ao início do texto. O professor pobre que realiza façanhas em sala de aula, pode comover pessoas na ficção (mesmo que sejam baseados em fatos reais) são momentos raros e nunca, no mundo capitalista a exceção é premiada. Por isso, afirmamos que esse discurso, evocado pelos pedagogos, torna-se retórica para vender livros. O problema real, concreto, é sempre abafado. Não faz parte do trabalho dos pedagogos lutar para que os professores passem a ostentar salários dignos. Não faria parte de sua incumbência ou será que é mais simples ficar ditando regras e normas para que a educação melhore?


Como um professor muitas vezes trabalha os três turnos (manhã, tarde e noite) pode ler livros pedagógicos para melhorar sua prática em sala de aula? Tem-se por raciocínio o seguinte: se o professor não lê a educação não melhora, logo não melhora por culpa do professor. Simples assim, não? Não! O pouco tempo de que dispõe gasta preenchendo pilhas de cadernetas e corrigindo provas, o que sobra (se é que sobra) dedica-se a outras atividades como família e outros afazeres. Alguns livros pedagógicos até citam essa problemática, porém quando o fazem as frases vêm sempre acompanhadas de outras que ratificam a acomodação dos docentes são elas: “... mas nós não podemos ficar esperando que esse problema (a remuneração) se resolva”; “... o professor que fica de braços cruzados culpando o seu salário foge de sua obrigação”. Paulo Freire em seu livro “Pedagogia do Oprimido”, afirma que “o opressor não libertará o oprimido” (pg. 26). Esquecem-se os pedagogos, que não lêem a obra freiriana como o próprio autor queria “com um pé na realidade”, que como o professor poderia professar o discurso de que educação é algo bom, quando ele próprio não consegue viver de educação? Essa contradição é pedra angular no fracasso do discurso docente. Outros dizem que mesmo que aumentássemos o salário dos professores nada mudaria. Ora, faça-o primeiro e em seguida vejamos se corrobora. Dizer que a educação não melhorara com um aumento salarial é desculpa política (e que infelizmente alguns pedagogos acabam por cair) para não investirem em educação. Se há dúvida, passemos da teoria para a prática. Pois, um professor que tem uma única turma, portanto, digamos, trabalha dois dias na semana, fica com três dias livres, poderia sim, ser cobrado por qualquer entidade caso não exercesse bem sua função, mas primeiro é necessário passar do plano ficcional para o real, do abstrato, para, concreto.


O sistema educacional dá maneira como se encontra não pode proporcionar isso ao professor. Enquanto as escolas particulares forem o ensino de suma excelência e a escola pública for o passatempo de jovens marginalizados que procuram a merenda para saciar a fome, o professor não poderá receber um salário digno, visto que a escola particular opera dentro da mais-valia, ou seja, os donos das instituições ficam com grande parte dos lucros e os professores, mão-de-obra, recebem parte ínfima desse montante. O sistema particular é mediado pelo código do consumidor, e não se pode fazer educação de verdade quando quem tem dinheiro manda, ou seja, o aluno, os pais. O professor é um reles empregado, não pode falar ao mesmo nível, nem projetar, novamente citando Freire, “uma situação dialógica nem dialética”. A interação anula-se, pois professor é subordinado ao aluno que paga pelo benefício da aprovação. Na escola pública, não há capital envolvido (não do ponto de vista da relação educador-educando). O aluno não paga para estudar, apenas estuda. Vê naquele diante de si, uma referência, uma figura financeiramente atraente. Sim, falamos financeiramente, pois acreditamos que sendo o docente alguém de referência salarial, pode se contrapor a imagens distorcidas, no entanto atraentes desse ponto de vista, como jogadores de futebol, cantores..., as fadadas celebridades, que em nada contribuem para a educação de jovens e adultos, mas ganham salários exorbitantes, não possuem nenhum papel social concreto, a não ser ludibriar e distrair as massas dos problemas reais da sociedade em que vivem.


O professor precisa ser mais bem remunerado para que possa lutar contra essa “Matrix” criada pelo capital. Neste momento, alguém poderia nos perguntar: “Mas, enquanto isso não ocorre, não temos nada a fazer, há outras prioridades?” Essa é a prioridade. Depois tudo acontecerá em enfeito dominó. “E se não vier o aumento salarial?” Então, a educação permanece caótica como está. De um lado, os pedagogos escrevendo livros sobre como fazer o milagre da multiplicação da educação sem recursos financeiros. O professor continuará sendo refém da escola particular e da extensa jornada de trabalho. A ficção contará belíssimas histórias que comoverão platéias, mas que em nada melhorarão a educação.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Participação do Brasil na 1ª Guerra Mundial

Aula de um professor de história comentando sobre a participação do Brasil na Primeira Guerra Mundial. (A história que os livros esquecem de contar).

Vale a pena assistir!


terça-feira, 2 de março de 2010

REFLEXÕES DE FREI BETO SOBRE O CONSUMO


Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos em paz em seus mantos cor de açafrão. Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: 'Qual dos dois modelos produz felicidade?'

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não, tenho aula à tarde'. Comemorei: 'Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho tanta coisa de manhã...' 'Que tanta coisa?', perguntei. 'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula de meditação!'

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados. Por isso as empresas consideram agora que, mais importante que o QI, é a IE, a Inteligência Emocional. Não adianta ser um super executivo se não se consegue se relacionar com as pessoas. Ora, como seria importantes os currículos escolares incluírem aulas de meditação!

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'. 'Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade, inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo virtual pela internet: não se pega AIDS, não há envolvimento emocional, controla-se no mouse. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizi­nho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos os valores, não há compromisso com o real! É muito grave esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos: somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também eticamente virtuais…

A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e honrosas exceções -, é um problema: a cada semana que passa, temos a sensação de que ficamos um pouco menos cultos. A palavra hoje é 'entretenimento'; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde à tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este refrigerante, vestir este tênis,­ usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!' O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba­ precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos seus pacientes. Colocá-los onde? Eu, que não sou da área, posso me dar o direito de apresentar uma su­gestão. Acho que só há uma saída: virar o desejo para dentro. Porque, para fora, ele não tem aonde ir! O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo, começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a catedral é o sinal de que ela tem história. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping Center. É curioso: a maioria dos shopping Center tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingos. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do McDonald's…

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: 'Estou apenas fazendo um passeio socrático. ' Diante de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: 'Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz.'


Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Luis Fernando Veríssimo e outros, de 'O desafio ético' (Garamond), entre outros livros.